Tarifas de 50% Podem Impactar Qualidade do Sistema Financeiro Brasileiro, Aponta Moody’s
Embora os bancos brasileiros não possuam grande exposição a empresas exportadoras, uma eventual combinação de fatores pode comprometer a rentabilidade das instituições

Desde que Donald Trump anunciou uma tarifa de 50% sobre todos os produtos do Brasil importados pelos EUA — com previsão de entrada em vigor em 1º de agosto — as incertezas comerciais entre os dois países aumentaram e as projeções para os mais diversos setores têm se deteriorado.
A principal preocupação recai sobre a perda de competitividade dos produtos brasileiros no mercado americano, especialmente das commodities com forte presença nos EUA, como café, carne bovina, suco de laranja, aço, papel e celulose. A lógica é simples: esses itens podem ser substituídos por concorrentes internacionais, reduzindo a participação brasileira e prejudicando a balança comercial.
Os EUA são o segundo maior parceiro de comércio do Brasil tanto em exportações quanto em importações, respondendo por 12% das vendas brasileiras — o que corresponde a 2% do PIB nacional. Em 2024, produtos como ferro e aço representaram 8,8% do comércio para os EUA, seguidos por aeronaves e seus equipamentos (6,7%).
Os exportadores de aviões e sucos estão entre os mais vulneráveis à tarifa. A Embraer, por exemplo, obtém mais da metade de sua receita no mercado americano. Já no segmento de suco de laranja, empresas nacionais como Sucocítrico Cutrale e Citrosuco são responsáveis por mais de 50% da produção global.
Por outro lado, na indústria de celulose, embora a Suzano gere 17% de sua receita com exportações para os EUA, a China permanece como seu principal mercado. No caso da carne bovina, os EUA responderam por apenas 6% das exportações brasileiras entre 2022 e 2024, enquanto a China foi destino de 67%. Algumas empresas como JBS e Marfrig, que já operam nos Estados Unidos, também poderiam ganhar competitividade com o novo cenário tarifário.
Mas há uma surpresa que pode ter passado despercebida por muitos. Embora os bancos brasileiros não possuam grande exposição a essas empresas exportadoras, uma eventual combinação de fatores, como queda nas exportações, desaceleração da atividade econômica e redução das margens empresariais pode impactar a qualidade das instituições financeiras. O movimento é capaz de deteriorar a qualidade dos ativos bancários e comprometer a rentabilidade das instituições, aponta a agência de análise de risco de crédito Moody’s.
Mesmo com as taxas de importação ainda em 10%, a Amcham — Câmara Americana de Comércio fora dos EUA — já observa sinais de desaceleração em diversos segmentos. Entre os setores com queda nas exportações para os EUA estão o de celulose (-14,9%), motores (-7,6%), máquinas e equipamentos (-23,6%), manufaturas de madeira (-14%) e autopeças (-5,6%). Com a possibilidade de elevação das tarifas para 50%, os efeitos negativos tendem a se intensificar, afetando não só a balança comercial, mas também o sistema financeiro brasileiro como um todo.
O que isso significa?
A preocupação central envolve o enfraquecimento das condições operacionais de empresas dependentes das exportações para os EUA. Com a possível retração na receita dessas companhias, os bancos tendem a adotar uma postura mais cautelosa na concessão de crédito a setores como aeronaves e sucos.
Isso pode reduzir o volume de financiamentos, tanto pela elevação do risco percebido pelas instituições financeiras quanto pela menor demanda de empresas que evitam contrair dívidas em um ambiente mais incerto. Esse efeito em cascata impacta o sistema financeiro, que passa a operar sob maior risco e menor margem de lucro.
A situação se agrava com a pressão inflacionária da Selic, consequentemente, levando o Banco Central a manter a taxa básica de juros em patamar elevado por mais tempo — atualmente, ela está em 15%.
Ou seja, a expectativa é que esses fatores somados a uma política monetária restritiva contribuam para a piora na qualidade dos ativos bancários.
Outro aspecto é que as famílias brasileiras já enfrentam um nível elevado de endividamento, que atingiu 49% em abril de 2025, segundo o Banco Central. A taxa de inadimplência — medida pelos empréstimos vencidos há mais de 90 dias — chegou a 3,5% em maio, o maior índice dos últimos cinco anos. Esse cenário torna os bancos mais conservadores na concessão de crédito ao consumidor.
A combinação entre juros altos e menor atividade econômica tende a desestimular o consumo e os investimentos, o que, por sua vez, pressiona a lucratividade dos bancos. Para a Moody’s, com as famílias enfrentando dificuldades para quitar dívidas, as instituições financeiras devem reduzir a oferta de crédito nos próximos meses, afetando o financiamento ao comércio exterior.
Apesar das implicações negativas, a exposição direta dos bancos brasileiros ao crédito voltado às negociações internacionais é considerada limitada. De acordo com a Moody’s, o Banco do Brasil teria impacto mínimo em caso de adoção da nova tarifa.
Em março de 2025, apenas 2,9% da sua carteira de crédito rural — que somava R$ 366 bilhões (US$ 66 bilhões) — era destinada a produtores de café, e 0,3% a produtores de celulose. Já os produtores de carne bovina, responsáveis por 17% dos financiamentos agrícolas da instituição, não seriam significativamente afetados.
Fonte: Forbes
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